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Mostrando postagens de 2020

Bacurau - o filme

Assisti ontem na Globo, porque Beth Formaggini me lembrou, Beth é, foi, foi minha professora de história, ela me lembrou no Face, mas lembrou. Não lembrou a mim especificamente, mas a todos que viram sua postagem.   Sobre o que é Bacurau? Acho que sobre muitas coisas. Mas a principal é uma cadeia discriminatória de raças. Um alemão que se acha superior aos americanos, os americanos que se acham superiores aos brasileiros ou latinos, brasileiros do sudeste associados aos americanos que se acham superiores aos brasileiros do nordeste, brasileiros do nordeste vendidos aos americanos que se acham superiores aos seus conterrâneos.     Mas Bacurau, como disse, é sobre muitas coisas: sobre o domínio dos recursos naturais por poucos em detrimento de muitos, no caso a água; sobre representantes do povo que vendem a vida, literalmente a vida, desse povo a quem tiver interesse em pagar.   Bacurau é sobre políticos que só aparecem de quatro em quatro anos oferecendo esmola ao povo, doa

Hoje minha mãe morreu

  Hoje, mamãe morreu. Ou talvez ontem, não sei bem. Recebi um telegrama do asilo: “Mãe morta. Enterro amanhã. Sinceros sentimentos.” Isso não esclarece nada. Talvez tenha sido ontem. O estrangeiro – Albert Camus     Hoje minha mãe morreu. Ao contrário de Meursault , personagem de Camus no livro “O estrangeiro”, eu não tenho dúvida se foi ontem ou se foi hoje. Foi hoje a morte de minha mãe, meu irmão mais velho me ligou para avisar, nesta terça-feira, 10 de novembro de 2020. Estou no sertão de Pernambuco e minha mãe faleceu no Rio, Rio de Janeiro onde nasci. Este mesmo irmão me disse outro dia, num telefonema, que minha mãe estava só me esperando para partir, eu, o único filho longe dela. Quase oitenta anos, coincidências, o romance de Camus foi lançado no ano em que minha mãe nasceu. Na Rádio Cidade, ouvida pela web, toca Sing, com Travis. Daqui a dez dias vou estar de volta a Cidade Maravilhosa, depois de três anos aqui pelo nordeste.   Eu, de um moleque, um pirral

Rua Sem Saída

   Puto com a lentidão do trânsito, Jaime virou na primeira à direita. Sorriu e acelerou espertamente na rua vazia de carros. Mudou o cambio para automático e se acomodou melhor no banco do BMW modelo ZR3 . Aumentou o volume do rádio sem precisar tirar as mãos do volante, verificou o nível do óleo e só não sentiu a tração das quatro rodas se ajustarem automaticamente porque a curva não era acentuada. Mas quando ia aproveitar a potência do motor, que ia de zero à cem em segundos, e a única coisa que ainda não tinha testado, teve que fazer uso dos freios ABS, que funcionaram com precisão - como tudo o mais dito no comercial de TV - , impedindo que o pará-choque se arranhasse no carrinho enferrujado de bebê tombado no final da rua. O emboço caído em vários pontos deixava ver os tijolos pequenos e sem furos do paredão de um galpão que fechava a rua. Caixotes de madeira, sacos de supermercados cheios de lixo e amarrados na boca, formavam bolas disformes distribuídas desordenadamente